CARIDADE (24): BOM HUMOR (5)

EVANGELHO – Lc 13, 18-21

Naquele tempo: Jesus dizia: “A que é semelhante o Reino de Deus, e com que poderei compará-lo? Ele é como a semente de mostarda, que um homem pega e atira no seu jardim. A semente cresce, torna-se uma grande árvore, e as aves do céu fazem ninhos nos seus ramos”. Jesus disse ainda: “Com que poderei ainda comparar o Reino de Deus? Ele é como o fermento que uma mulher pega e mistura com três porções de farinha, até que tudo fique fermentado”.
– Palavra da Salvação
– Glória a vós, Senhor

Olhar para Jesus:
Jesus compara hoje no Evangelho o Reino de Deus com a semente de mostarda e com o fermento. Podemos focar nesta ideia: o Reino de Deus, a santidade, começa pequeninha e vai crescendo pouco a pouco, paulatinamente.

Uma pessoa vai crescendo espiritualmente pouco a pouco, quase sem perceber. O importante é perseverar na luta, na luta cotidiana, que é quase sempre em coisas pequenas. Não importa que os nossos desejos de santidade sejam efêmeros e inconstantes. O importante é perseverar, começar e recomeçar.

São Josemaria costumava dizer que cada vez que fazia um ato de contrição, recomeçava… Vamos experimentamos a nossa imperfeição constantemente, mas não importa. A nossa debilidade atrai o amor divino, um amor que o leva a clamar: “Pode uma mulher esquecer-se daquele que amamenta? Não ter ternura pelo fruto de suas entranhas? E mesmo que ela o esquecesse, eu nunca me esquecerei de ti”.

Muitas pessoas se desanimam quando têm uma queda. E é justamente isso que o demônio quer: que desistamos de ser melhores, que nos convençamos que nunca vamos conseguir dar um passo na vida espiritual. Mas não devemos cair na artimanha do demônio. Se eu me levanto, dou um passo e caio e me levanto novamente, dou mais um passo e caio, já dei dois passos. Com a ajuda de Deus e a nossa perseverança, podemos chegar bem longe. São Josemaria dizia que para sermos santos, precisamos saber começar e recomeçar uma e outra vez até o último instante da nossa vida. E é este propósito que faremos hoje diante de Deus: batalhar até o último instante da nossa vida.

Dando continuidade à nossa série das terças-feiras sobre a caridade, estamos refletindo sobre a virtude do bom humor. Na última vez falamos de mais um motivo que nos faz rir: estarmos descansados. Hugo de Azevedo no seu livro, O Bom Humor, vai falar de mais um: o amor. Vejamos.

* * *

Ainda outro motivo para o humor: o amor. O amor e a amizade. O homem que ama é feliz (sobretudo se é correspondido) e brinca. A alegria própria da amizade manifesta-se em riso, em jogo, em brincadeiras.

Veja-se um pai “derretido” com o seu nenê: todo ele é um palhaço improvisado. Faz caretas, pula, agacha-se, assobia… Veja-se um casal de namorados: todos eles são olhinhos risonhos, gargalhadinhas soltas…

A felicidade leva ao bom humor. Tudo lhe serve de pretexto para exalar alegrias.

– Gosto muito de perder no pôquer!
– Mas não gosta de ganhar?
– Ah… isso de ganhar é ainda muito melhor!

Quem é feliz gosta do jogo da vida. Perca ou ganhe alguma partida, tanto faz, pois a vida está ganha de antemão.

E quando o amor ou a amizade são trabalhosos, pelas dificuldades da existência, sendo a amizade autêntica e o amor verdadeiro, o bom humor aparece também para animar os amigos. Quantos casos magníficos, como o do bom humor com que Thomas More confortou mulher e filhos nos tempos do seu martírio!

Thomas More foi casado e teve quatro filhos. Nem mesmo quando foi preso permitiu que isso quebrasse a unidade e a paz familiar. De acordo com um de seus biógrafos, buscava celebrar com dignidade as festas importantes mesmo na prisão. Uma das formas que fazia era vestir-se com mais elegância, ainda que com um vestuário escasso de prisioneiro.

Em uma das cartas que escreveu a sua filha, o santo a consola enquanto estava na prisão. “Está, pois, tranquila, minha filha, e não te preocupes comigo, seja o que for que me aconteça neste mundo. Não pode acontecer nada que Deus não tenha querido. Ora, tudo o que Ele quer, por pior que possa parecer-nos, é o que há de melhor para nós”.

É impressionante o exemplo de bom humor que deu ao ser decapitado. O chanceler da Inglaterra foi condenado por não ter aderido ao cisma religioso provocado pelo rei Henrique VIII. Ao inclinar a cabeça, o santo olhou para o seu carrasco e disse: “Ânimo, rapaz! Não tenhas medo de cumprir o teu dever. O meu pescoço é muito curto. Cuida, pois de não cortá-lo de lado, para que não fique abalado o teu prestígio”. E ainda acrescentou com bom humor: “Deixa-me ajeitar a barba, não aconteça que também a cortes. Ela nada tem nada a ver com isso”.

De outra pessoa, um bom cristão que conheci vagamente, contaram-me que, quando lhe perguntavam como estava — estando ele gravemente doente —, sempre respondia:

– “Melhor, melhor, muito obrigado!”, embora fosse piorando a olhos vistos. Até que um dia explicou:

– “Estou melhor, sim… Melhor do que mereço!”

O bom humor é uma força, capaz de transformar uma situação violenta numa interessante aventura.

Assim o aconselha o meu repetido Chesterton, exemplar cultor do bom-humorismo: se a gaveta da sua escrivaninha se recusa teimosamente a abrir-se, não se irrite; encare essa resistência como um desafio e como uma luta titânica entre gigantes; e, cheio de ardor bélico, lance-se à tremenda batalha, até vencer o inimigo!

Na verdade, o bom humor está unido ao espírito esportivo (o que é o esporte senão um jogo?), e é igualmente comunicativo; assim se acaba por vencer dificuldades que a tristeza e o pessimismo tornariam insuperáveis.

“Onde quer que a alegria esteja ausente, onde quer que desapareça o senso do humor, com certeza ali não estará o espírito de Jesus”, escreveu o então cardeal Joseph Ratzinger em seu livro “Princípios teológicos”.

Termino com uma oração de São Thomas More para pedir o bom humor:
Dai-me, Senhor a saúde do corpo e, com ela, o bom senso pra conservá-la o melhor possível. Dai-me, Senhor, uma boa digestão e também algo para digerir. Dai-me uma alma santa, Senhor, que mantenha diante dos meus olhos tudo o que é bom e puro. Dai-me uma alma afastada do tédio e da tristeza, que não conheça os resmungos, as caras fechadas, nem os suspiros melancólicos… E não permitais que essa coisa que se chama o “eu”, e que sempre tende a dilatar-se, me preocupe demasiado. Dai-me, Senhor, o sentido do bom humor. Dai-me a graça de compreender uma piada, uma brincadeira, para conseguir um pouco de felicidade e para dá-la de presente aos outros. Amém.

CARIDADE (24): BOM HUMOR (5)

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