ALEGRIA: DA FIDELIDADE (II)

EVANGELHO Jo 16, 12-15

Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: Tenho ainda muitas coisas a dizer-vos, mas não sois capazes de as compreender agora. Quando, porém, vier o Espírito da Verdade, ele vos conduzirá à plena verdade. Pois ele não falará por si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido; e até as coisas futuras vos anunciará. Ele me glorificará, porque receberá do que é meu e vo-lo anunciará. Tudo o que o Pai possui é meu. Por isso, disse que o que ele receberá e vos anunciará, é meu.
– Palavra da Salvação
– Glória a vós, Senhor

Olhar para Jesus:
É interessante que Jesus diga aos Apóstolos que eles ainda não eram capazes de compreender muitas coisas que Ele tinha a lhes dizer. E que isto seria feito pelo Espírito Santo, que Jesus chama muitas vezes de Espírito da Verdade. O Espírito Santo lhes conduzirá à plena verdade. O Espírito Santo continua atuando na Igreja para conhecermos a Verdade e de maneira cada vez mais perfeita. Que alegria deve sentir o Espírito Santo por ser fiel à verdade e, assim, nos ajudar a conhecermos a verdade que salva, que liberta. Isto nos leva a pensar na alegria da fidelidade e darmos continuidade às palavras do Padre Francisco Faus. Vocês verão que maravilhosas são suas palavras.

* * *

Naturalmente, para poder saborear a alegria da fidelidade é preciso ter um ideal, um sentido para a vida, superior ao de ceder aos desejos momentâneos: um ideal que nos dê a força de enfrentar, de lutar, de superar; que não nos deixe limitados a reagir, reclamar e fugir.

Duas doenças mortais da fidelidade

• A fidelidade condicionada

É a da pessoa que, nos seus compromissos “vitais” (os que definem o sentido da vida), não sabe dizer um “sim” pleno, como o “faça-se” de Nossa Senhora (cf. Lc 1, 38).

Essas pessoas têm o “sim” poluído pelo “se”, pelo condicional: “Serei fiel, se não ficar difícil continuar, se não for “chato”, se não me cansar de viver com a mesma pessoa ou de fazer as mesmas coisas…”.

A incapacidade de decidir-se a assumir compromissos com fé e fortaleza explica a inconsistência de muitas vidas atuais. Para os egoístas, para os que não querem saber da grandeza do amor, a palavra “assumir” é substituída pela palavra “experimentar”: “Vou experimentar, vou ver se gosto, vou ver se não me canso, vou ver se dá… Se não der, largo tudo”

No livro O senhor dos Anéis, Tolkien coloca na boca de um dos personagens uma frase que deveríamos meditar: «Desleal é aquele que se despede quando o caminho escurece».

Quando escurece, quando as coisas se tornam difíceis, ou as circunstâncias ou as pessoas nos desnorteiam, em suma, quando surge uma crise, é então a hora em que Deus nos dá a oportunidade e a graça de “superar” aquilo e de “superar-nos” a nós mesmos.

Toda crise pode ser uma crise de crescimento (como a da adolescência), ou uma crise terminal (como a do paciente desenganado). O mal consiste em que quase todos encaram como terminais crises que, aos olhos de Deus, deveriam ser de crescimento. Deveriam ser uma fase decisiva da vida, em que aprendemos a despojar-nos da imaturidade, de egoísmos banais, de frivolidade; e vamos trocando esse entulho por virtudes que não tínhamos e agora podemos adquirir: desprendimento, humildade, fortaleza, prudência, doação… As crises são porta aberta para um amor maior, temperado na dor.

Quem não tentou fazer isso, não conhece a felicidade de ser fiel. São Paulo a experimentou de tal modo que, estando preso e a ponto de ser martirizado, escreveu na cadeia o que eu chamaria “o epitáfio feliz de uma vida realizada”: Chegou o tempo da minha partida. Combati o bom combate, terminei a corrida, fui fiel (2 Tm 4, 6-7).

Se a dificuldade, e concretamente o sacrifício que toda fidelidade exige, nos fazem vacilar, estamos à beira de enveredar pelo que Rafael Cifuentes chama “ vocação de vira-lata”[2], que é uma opção de vida extremamente perigosa.

• A fidelidade de manutenção

É a fidelidade da pessoa que não abandona o barco, mas se limita a “ir tocando” a vida com rotina morna e apagada.

Alguns parecem fiéis por pura inércia. O marido e a mulher continuam juntos no lar, mas sem renovação de sentimentos e atitudes, sem diálogo fecundo e sem novas iniciativas. A alegria da vida familiar soa, para eles, a sonho ingênuo de lua de mel. Que diriam se ouvissem São Josemaria dizer-lhes, como repetia a casais de qualquer idade: «Vocês devem tratar-se como se sempre fossem noivos»?

«Não esqueçam –dizia-lhes − que o segredo da felicidade conjugal está no cotidiano, não em sonhos. Está em encontrar a alegria escondida de chegarem ao lar; no relacionamento afetuoso com os filhos; no trabalho de todos os dias, em que toda a família colabora; no bom humor perante as dificuldades, que é preciso enfrentar com espírito esportivo»[3].

Coisas análogas deveriam dizer-se sobre a fidelidade de leigos, sacerdotes e religiosos à vocação e à missão divina com a qual se comprometeram.

A fidelidade de manutenção é, para os mornos, um mero vegetar acomodado. Esqueceram-se da palavra “mais” e da palavra “além”. Como dizia Ernest Hello, «se não existisse a palavra exagero, o homem medíocre a inventaria»[4].

Como evitar essas duas doenças? Entre outras coisas, vendo se conseguimos dar uma resposta positiva (com a cabeça, o coração e as ações) às seguintes perguntas:

─ Eu tenho “metas”, ou vou só no embalo; ou seja, proponho-me frequentemente modos concretos – claros e definidos − de dar mais, de alegrar mais os outros, de ajudar mais, quebrando assim a rotina?

─ Trato com Deus desse desejo de superação? Medito, rezo, leio livros de espiritualidade, procuro conselhos e experiências para sair do meu trilho monótono e renovar meus compromissos?

─ Se me pedissem que escrevesse num papel os desafios de superação, que atualmente me proponho para dar um salto de qualidade, ou para superar uma crise, deixaria a folha em branco? Quantas linhas poderia preencher?

Quero terminar este capítulo pedindo-lhe que medite as palavras que Cristo utiliza para abrir a porta do Céu a uma alma que foi fiel até à morte. Muito bem, servo bom e fiel, já que foste fiel no pouco, eu te confiarei muito. Entra na alegria do teu Senhor! (Mt 25, 21).

Lição: será que minha fidelidade é condicionada? Será que é de manutenção? Que as palavras do Padre Francisco sejam um empurrão para sermos mais fieis e, consequentemente, mais felizes.

ALEGRIA: DA FIDELIDADE (II)

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