VIRTUDES HUMANAS (15): PACIÊNCIA (5)

EVANGELHO – Mt 8, 1-4

Tendo Jesus descido do monte, numerosas multidões o seguiam. Eis que um leproso se aproximou e se ajoelhou diante dele, dizendo: “Senhor, se queres, tu tens o poder de me purificar”. Jesus estendeu a mão, tocou nele e disse: “Eu quero, fica limpo”.
No mesmo instante, o homem ficou curado da lepra. Então Jesus lhe disse:
“Olha, não digas nada a ninguém, mas vai mostrar-te ao sacerdote, e faze a oferta que Moisés ordenou, para servir de testemunho para eles”.
– Palavra da Salvação
– Glória a vós, Senhor

Olhar para Jesus:
São Mateus começa dizendo que Jesus tendo descido do monte… De fato, toda esta pregação de Jesus que começou com o Sermão das Bem-aventuranças no capítulo 5, foi realizada no alto do monte que é conhecido como monte das Bem-aventuranças. Alguns autores comparam o monte com o Céu, onde Jesus fez pregação, e agora desce à terra onde estão os pecadores, simbolizado pelo leproso. Dizem, então, que Jesus desce do Céu para vir curar os pecadores. Outros dizem que Jesus no alto do monte pregou a Palavra de Deus e agora, para dar testemunho que é o próprio Deus, começa a fazer milagres, mostrando seu poder sobre toda realidade humana. Todos nós temos que nos ver na figura deste leproso, cheio de lepra, de pecados, necessitado da ajuda de Deus.

Dando continuidade à nossa série das sextas-feiras sobre as virtudes humanas, na semana passada, continuando nossa reflexão sobre a paciência, dissemos que a grande causa das nossas impaciências é o egoísmo, é centrar na vida no obter. Agora vamos falar que nossa vida deve estar centrada no edificar.

* * *

EDIFICAR

O QUE A VIDA ESPERA DE NÓS

No relato autobiográfico intitulado “Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração”, o psiquiatra Viktor Frankl relata o ambiente de profundo abatimento que se ia apossando do espírito de seus companheiros de barracão, no campo de concentração nazista em que se encontravam, à medida que as expectativas de libertação se afunilavam e o futuro aparecia cada vez mais sombrio.

Era comum ouvir-se dizer: – “Eu já não espero mais nada da vida”.

“Que resposta podemos dar a essas palavras?” – perguntava-se Frankl. E a seguir, com vibrações de descoberta, explica a nova luz que se acendeu nele e que procurou transmitir aos outros:

“Do que realmente precisamos é de uma mudança radical da nossa atitude perante a vida. Temos que aprender nós mesmos, e depois ensinar aos desesperados, que na verdade não é importante o que nós esperamos da vida; importante é o que a vida espera de nós”.

Numa noite em que um corte de luz mergulhou os prisioneiros numa depressão ainda maior, Frankl, embora gelado e sonolento, irritado e cansado, sentiu que era preciso fazer alguma coisa para infundir ânimo àqueles pobres farrapos humanos que já desistiam da vida. Levantou-se, então, e falou. Expôs com veemente ardor a sua descoberta. E essa ideia de que a vida tem um sentido infinitamente superior ao de simplesmente satisfazer desejos, obter coisas, passar bem, gozar de boa saúde, invadiu, como um clarão de esperança, aqueles corações agoniados.

Entenderam que Deus, a esposa, os filhos, os amigos, o mundo esperavam deles (deles que pareciam animais acuados, prestes a serem levados para o matadouro) um testemunho – na vida ou na morte – de que o ser humano foi feito para algo muito maior do que comer, beber, gozar, rir na fortuna e chorar na adversidade. Deus e os outros esperavam algo que só cada um deles, com grandeza de alma, podia dar. Deus e o mundo “precisavam” de cada um deles!

Esta concepção da vida, como é óbvio, opõe-se frontalmente à atitude egoísta que descrevemos antes. É a outra possível vertente da nossa existência. A única verdadeira. A vida só pode ser encarada como uma missão a cumprir, que nos é confiada por Deus, como uma edificação de que somos responsáveis e de que outros dependem. Não vivemos para obter; vivemos para edificar.

QUERENDO EDIFICAR UMA TORRE

O próprio Cristo utiliza a imagem da edificação para falar de nós. Diante do seu futuro, o homem é um construtor. Deus facilita-lhe o material, desvenda-lhe aos poucos as linhas mestras da “obra” a ser realizada e estende-lhe a mão para ajudá-lo na tarefa. Mas cada qual é responsável por fazer a obra bem-feita. Quem de vós, se quiser edificar uma torre, não se senta primeiro e calcula…? (Lc 14, 28).

Aprofundando na imagem da edificação, Cristo diz-nos ainda como se deve fazer o cálculo, qual é a garantia de que a construção será sólida e indestrutível: Aquele que ouve as minhas palavras e as põe em prática é semelhante a um homem prudente que edificou a sua casa sobre rocha. Caiu a chuva, vieram as enchentes, sopraram os ventos e investiram contra aquela casa: ela, porém, não caiu, porque estava edificada sobre rocha (Mt 7, 24-27).

Construir sobre rocha, fazer uma edificação que nenhuma contrariedade – vento ou chuva, tremores ou enchentes – possa abalar, só se consegue quando o alicerce sobre o qual se levanta é a palavra de Cristo: Aquele que ouve as minhas palavras e as põe em prática…

É a palavra, é a mensagem de Cristo que indica a “mão de direção” que Deus quer deixar sinalizada no coração dos homens: a mão do Amor. Amar a Deus de todo o coração, com toda a alma e com todas as forças; amar o próximo como a nós mesmos, mais ainda, como Cristo nos amou – ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos seus amigos (Jo 15, 13) –, este é o alicerce, este é o pilar firmíssimo, esta é a “mão de Deus”! Quando se vai por ela, descobre-se que a única coisa que a vida e as pessoas nos estão pedindo a toda a hora é amor: amor que consiste na aceitação confiante da Vontade de Deus e da sua Cruz santa; ou amor que aprenda, num crescendo que nunca termina, a compreender os outros, a desculpá-los, a perdoá-los, a servi-los, a dar-se sem cálculos nem mesquinharias.

Quando nos decidimos a enveredar por essa senda, ficamos pasmados ao perceber que cada vez há menos coisas que nos pegam na contramão e nos fazem perder a paciência. E isto é assim porque cada vez se torna menor o egoísmo que trafega em sentido contrário ao do amor.

Façamos uma pequena experiência. Escrevamos em forma de lista todas as coisas que, na última semana, nos aborreceram e mexeram com a nossa paciência. A seguir, diante de cada item, anotemos uma pergunta: que tipo de amor Deus me pedia aí? E prossigamos a experiência, imaginando: se eu tivesse vivido naquele momento o tipo certo de amor, teria havido impaciência? A resposta seria, naturalmente, “não”. Não haveria impaciência se eu tivesse amado. Talvez possamos retrucar: “Mas é que eu não sou santo” – o que é verdade –, mas o que não poderemos dizer nunca honestamente é que ali havia uma contrariedade que o amor não podia superar.

Na realidade, todos os exercícios de paciência consistem em exercícios de amor. Conheço várias pessoas – graças a Deus conheço muita gente boa – que, ao voltarem a casa com toda a carga do cansaço do dia, vão rezando o terço no trânsito ou carregam consigo um livro de pensamentos espirituais, para lerem e meditarem uma ou outra frase ao pararem no semáforo demorado ou no engarrafamento incontornável. Ao mesmo tempo, vão espremendo os seus cansados miolos, tentando concretizar: “Que iniciativa, que detalhe, que palavra posso preparar para que a minha chegada a casa seja um motivo de alegria para a minha mulher, ou para o meu marido, e para os meus filhos?” E, assim, homens e mulheres cujo retorno ao lar era antes soturno e irritado, tornam-se – em virtude do amor a Deus e aos outros, que se esforçam por cultivar – corações pacientes, que espalham a paz e a alegria à sua volta.

Lição: já sabemos agora qual é a mão que devemos percorrer na vida: a mão do amor, da alegria de fazer os outros serem felizes. Saibamos percorrer esta mão e nossas impaciências irão desaparecendo.

VIRTUDES HUMANAS (15): PACIÊNCIA (5)

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