VIRTUDES HUMANAS (14): PACIÊNCIA (4)

EVANGELHO – Mt 5, 27-32

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos:
“Ouvistes o que foi dito: Não cometerás adultério”. Eu, porém, vos digo: Todo aquele que olhar para uma mulher, com o desejo de possuí-la, já cometeu adultério com ela no seu coração. Se o teu olho direito é para ti ocasião de pecado, arranca-o e joga-o para longe de ti! De fato, é melhor perder um de teus membros, do que todo o teu corpo ser jogado no inferno. Se a tua mão direita é para ti ocasião de pecado, corta-a e joga-a para longe de ti! De fato, é melhor perder um dos teus membros, do que todo o teu corpo ir para o inferno. Foi dito também: “Quem se divorciar de sua mulher, dê-lhe uma certidão de divórcio”. Eu, porém, vos digo: Todo aquele que se divorcia de sua mulher, a não ser por motivo de união irregular, faz com que ela se torne adúltera; e quem se casa com a mulher divorciada comete adultério”.
– Palavra da Salvação
– Glória a vós, Senhor

Olhar para Jesus:
no Evangelho de hoje Jesus nos ensina várias realidades acerca do matrimônio. Fala do pecado de adultério e que ele pode ser cometido tanto por ato como por pensamento e também quando alguém se casa com uma pessoa que ainda tem o vínculo matrimonial de um casamento anterior feito na igreja e que não foi declarado nulo. Depois Nosso Senhor fala da gravidade do pecado utilizando uma linguagem forte e figurativa: se o teu olho é para ti ocasião de pecado, arranca-o e joga-o para longe de ti. Jesus nos mostra a seriedade com que devemos lutar contra o pecado, principalmente se ele é grave. Para ter noção da gravidade do pecado basta olhar tudo o que Cristo sofreu na sua Paixão por causa dele.

Vamos retomar hoje a nossa série das sextas-feiras sobre as virtudes. Estamos falando sobre a virtude da paciência. Na última vez falamos sobre os tipos de impaciência e que elas têm a ver com a mão e a contramão. Impacientamo-nos com as coisas que vem no sentido contrário à mão que escolhemos seguir na vida. Para entender melhor agora esta verdade, o Padre Francisco irá falar agora de “obter” e “edificar”. Vejamos.

* * *

OBTER (egoísmo)

É comum perguntar a uma criança: – “O que você quer ser quando crescer?” A resposta pode ir desde “engenheiro igual ao papai” até “bombeiro” ou “jogador da seleção brasileira”.

Menos comum é perguntar: – “O que você quer fazer quando for grande?” Possivelmente, a resposta será: “Estudar, namorar, casar”… Mas outras crianças ficarão desnorteadas perante uma pergunta dessas. Elas sabem bem qual é a imagem ideal de si mesmas em seus “sonhos”, mas custa-lhes considerar a vida como tarefa.

Ora, o que é totalmente incomum é perguntar: – “O que você quer dar, o que você gostaria de dar quando for grande?” E, no entanto, esta é a única pergunta que deveria fazer realmente sentido para um ser humano.

A atitude de muitos perante a vida é radicalmente egoísta. O mundo é “para mim”, a vida é “para mim”. Mesmo os amores são vistos como um meio de obter o benefício da realização pessoal. É por isso que muitos pensam em marido ou mulher só enquanto “gostarmos”, ou seja, enquanto o egoísmo receber vantagens dessa união. É só começarem, porém, os sacrifícios, que haverá despedida e partirão para outra. E os filhos? Às vezes, nem sequer se pensa neles, e se espera tanto para tê-los que – com perdão do leitor – a decisão de deixar descendência acaba por ser tomada depois da menopausa.

O egoísta, aquele que só quer usufruir da vida, que quer “realizar-se” colocando o seu “eu” como meta e centro do mundo, esse só sabe repetir as palavras que Cristo põe na boca do filho pródigo: “Pai, dá-me a parte que me toca” (cf. Lc 15, 12).

O egoísta é monótono. Dirige-se a Deus e aos outros, dizendo sempre: “Dá-me!” É um homem que vive para pegar, para tomar, para armazenar, para desfrutar, em suma, para obter…

O egoísta parece ter, dentro do coração, um cachorrinho obsessivo, que dia e noite late sem parar, com voz esganiçada e estridente: Eu! Eu! Eu! E, quando a voz afina: Mim! Mim! Mim!

Só que o mundo está repleto de outros cachorros iguais e lhe responde com o eco das suas próprias palavras, de modo que por toda a parte se lança contra ele o mesmo ganido: Eu! Eu! Eu! Certamente o mundo não costuma fazer-nos a toda a hora reverências orientais nem nos estende aos pés tapetes vermelhos.

NA CONTRAMÃO DOS HOMENS E DE DEUS

Desse entrechoque de egoísmos, logicamente, hão de sair faíscas. Um encontrão! Uma cotovelada! Um “chega pra lá!” Um “eu primeiro!” Um “espere um pouco e você vai ver!” A colisão de egoísmos é inevitável, pois o meu egoísmo sempre vai na contramão do outro, e é fisicamente impossível colocar dois centros diferentes no mesmo círculo ou dois umbigos do mundo exatamente no mesmo ponto.

Estamos vendo, e parece coisa clara, que a maior parte das nossas impaciências são apenas egoísmos contrariados. Se as fôssemos examinando uma após outra, numa espécie de microscópio espiritual, acabaríamos verificando que, nelas, nas impaciências, estão todas as cores de que o egoísmo humano se tinge, quer seja a cor orgulhosa, quer a comodista, a hedonista, a sensual ou a invejosa… Todas aquelas cores do espectro em que a luz triste do egoísmo se dispersa.

Alguém já disse – sem dúvida com exagerada dureza – que o mundo é um chiqueiro de egoísmos, onde estes, em recinto fechado, se mordem e dilaceram. Algo parecido com isso é o que não tardará a descobrir, por experiência própria, quem adotar como filosofia de conduta “gozar a vida”, “passar o melhor possível”, “conseguir o máximo”, “levar vantagem em tudo”.

O pior, porém, não é que isso tudo não passe de uma ilusão trágica, decepcionante, num mundo que não nos abre alas como ao seu “príncipe”. O pior é que o egoísta, por princípio, anda sempre na contramão de Deus, e isso é muito mais sério e perigoso.

Deus só tem uma mão: o Amor. O egoísmo trafega em outro sentido. É significativo que uma condição prévia para andar na mão de Deus e para aprender o amor cristão seja esta: Quem quiser salvar a sua vida – diz Cristo – a perderá; mas quem perder a sua vida por amor de mim [quem souber sacrificá-la por amor], a salvará (cf. Mt 16, 25 e Mc 8, 35). A mão de Deus é o Amor. Sair dela é pegar a contramão, e aí todas as colisões são inevitáveis.

O egoísmo colide com tudo e, além disso, tem a triste faculdade de tornar negativas todas as coisas, opondo-as a si. O egoísta, por exemplo, em vez de valer-se do temperamento da esposa para saber “como” deve amá-la, serve-se disso como motivo para humilhá-la e ofendê-la. Não pensa: “Ela é lenta, vou estimulá-la, vou ajudá-la”. Pensa: “Ela é lenta; atrasa tudo! Não julgava que fosse tão lerda quando casei! Isto não pode continuar!” São duas maneiras opostas de reagir perante uma mesma situação. Duas maneiras que se podem dar em todas as situações. As mais belas coisas estiolam nas mãos do egoísta.

Vale a pena repisar bem a afirmação de que o nosso egoísmo é a causa fundamental dos nossos aborrecimentos. Assim como o lendário Rei Midas tinha o poder de transformar em ouro tudo o que tocava, o egoísta tem a virtude de transformar em pontas, em cacos de vidro, em navalhas e espinheiros, tudo o que não se curva aos seus desejos.

Lição: que clarividência tem estas palavras do Padre Francisco: como fica clara a relação do egoísmo com a impaciência. Aproveitemos hoje para decidir ser menos egoístas e trilhar mais o caminho de Deus que é o caminho do amor.

VIRTUDES HUMANAS (14): PACIÊNCIA (4)

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